sábado, 20 de junho de 2009

Os "bunkers" virtuais

por Clóvis Rossi


Carta do leitor Jorge Henrique Singh, aparentemente um estudante, publicada no domingo, ajuda a entender não apenas o quadro na USP como, mais amplamente, a catatonia da sociedade brasileira.

Diz Singh, em sua carta, que "os estudantes pesquisam, conversam e protestam em rede antes de se deixarem levar por pregadores ideológicos profissionais" .
Então tá, os estudantes retiraram-se para um "bunker" virtual em que "protestam em rede". Enquanto isso, o que ele chama de "pregadores ideológicos profissionais" tomam conta da vida real (e da USP) -sem que os virtuais saiam um pouco de seu mundinho.
Vale para a USP, vale para o conjunto da vida em sociedade. Basta ver a quantidade de "protestos em rede" que giram em torno dos escândalos políticos sem conseguir comover os autores, que preferem a vida real (e a bufunfa real).
Faz pouco, o colunista do "New York Times" Nicholas D. Kristof produziu um belo texto mostrando que a esmagadora maioria dos blogs ou demais instrumentos em rede trava um diálogo de "nós com nós mesmos", ou seja, com quem pensa da mesma maneira (no caso dos Estados Unidos, democratas com democratas, neocons com neocons e por aí vai).
Não há verdadeiramente diálogo se por este se entender um debate entre ideias diferentes. Há um monólogo em que se ouvem apenas vozes com a mesma entonação, uma espécie de onanismo virtual, sem contato com o sexo oposto (no caso, as ideias opostas).
Com isso, desperdiçam-se as possibilidades de democratização oferecidas pela internet. Há, sim, uma imensa cacofonia de vozes, mas, na outra ponta, os ouvidos se fecham para aquelas que não são agradáveis, por desafiarem certezas cultivadas nos "bunkers" virtuais.
Pena que os problemas se resolvam é na vida real.

[texto publicado no jornal Folha de São Paulo em 16 de Junho de 2009]

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